terça-feira, 28 de maio de 2013



Deveres de tolerância de uma igreja em relação às demais

As igrejas estão umas para as outras como as pessoas entre si; nenhuma tem jurisdição sobre a outra, estando todas sujeitas à jurisdição única do governo civil. O governo civil, por sua vez, não pode outorgar jurisdição ou poder a nenhuma igreja em particular. É irrelevante que o magistrado civil passe a pertencer ou deixe de pertencer a uma Igreja, pois esta nem ganha nem perde direitos com isso.


Se, havendo duas ou mais igrejas divergentes, o poder tivesse que ser outorgado a uma delas, não teríamos critério com que distinguir a qual delas seria. Tampouco se poderia recorrer à ideia de que o poder caberia à mais ortodoxa em detrimento da herética, porque ortodoxia e heresia são noções que cada uma aplica ao seu modo (ortodoxo é quem crê comigo, quem crê noutra coisa é – para mim – herético). Além disso, mesmo que fosse possível determinar qual delas tem razão, isso não lhe daria poder sobre as outras, porque tal poder cabe apenas ao magistrado civil e se limita à força externa (incapaz, como já foi dito, de converter o coração).

Observa que os homens religiosos costumam defender a paz e a tolerância quando não têm o magistrado civil ao seu lado, mas costumam gritar pela perseguição e combate dos hereges quando contam com seu apoio. Da mesma forma, quando têm o magistrado civil ao seu lado, não se ocupam da condenação dos pecados e maus costumes do governante ou de sua corte, como seria de esperar de homens tão vivamente comprometidos com a religião.

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